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segunda-feira, 31 de março de 2014

Assistam a este vídeo - MUITO BOM!!!!

Aos Deuses - Ricardo Reis (Fernando Pessoa)




Aos deuses peço só que me concedam

O nada lhes pedir.  A dita é um jugo

E o ser feliz oprime

Porque é um certo estado.

Não quieto nem inquieto meu ser calmo

Quero erguer alto acima de onde os homens

Têm prazer ou dores.

domingo, 30 de março de 2014

Por não estarem distraídos - Clarice Lispector























Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos, a alegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que, por admiração, se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles. Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria peso à levíssima embriaguez que era a alegria da sede deles. Por causa de carros e pessoas, às vezes eles se tocavam, e ao toque - a sede é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras - e ao toque brilhava o brilho da água deles, a boca ficando um pouco mais seca de admiração. Como eles admiravam estarem juntos! Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não vira, ela que, estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham prestado atenção, só porque não estavam bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos.

quinta-feira, 27 de março de 2014

Alberto da Cunha Melo

























O céu parece revestido
de uma camada de cimento:
deixo as marquises porque sei
que esta chuva não passará.
Se esperasse um tempo de paz,
nem meu túmulo construiria.
Começo e recomeço a casa
de papelão em pleno inverno.
Um plano, um programa de ação
debaixo de uma árvore em prantos,
e voltar à primeira página
branca e ferida pela pressa.
A poesia já não seduz
a quem mais forte ultrapassou-a,
libertando um pouco de vida
e luz, da corrente de estrelas.
Toda renúncia nos convida
a recomeçar outra busca,
porque algo a inocência perdeu
no chão, para arrastar-se assim.

quarta-feira, 26 de março de 2014

Alberto da Cunha Melo




Cai um silêncio de ondas longas
e sucessivas como a chuva.
E que silêncio será esse
que cai assim antes de mim?
Fauna marinha, gestos lentos
de anjos calados golpeando
um polvo em fúria que me espera
(sob os sonhos). Há quanto tempo?
Poucos amigos, tudo salvo,
ainda temos nossas raivas
e uma esperança ilimitada
nos setembros. Mas, até quando?
Caem livros silenciosos
das prateleiras: baixa a luz
morna e abundante sobre as capas.
Que foi feito de tanta noite?
A esperança nova se agarra
entre as barreiras e as ossadas
de nossos morros. E por que
morremos antes de salvá-la?

Fragmentos - Vladimir Maiakóvski




1
Me quer ? Não me quer ? As mãos torcidas
os dedos
despedaçados um a um extraio
assim tira a sorte enquanto
no ar de maio
caem as pétalas das margaridas
Que a tesoura e a navalha revelem as cãs e
que a prata dos anos tinja seu perdão
penso
e espero que eu jamais alcance
a impudente idade do bom senso
2
Passa da uma
você deve estar na cama
Você talvez
sinta o mesmo no seu quarto
Não tenho pressa
Para que acordar-te
com o
relâmpago
de mais um telegrama
3
O mar se vai
o mar de sono se esvai
Como se diz: o caso está enterrado
a canoa do amor se quebrou no quotidiano
Estamos quites
Inútil o apanhado
da mútua dor mútua quota de dano
4
Passa de uma você deve estar na cama
À noite a Via Láctea é um Oka de prata
Não tenho pressa para que acordar-te
com relâmpago de mais um telegrama
como se diz o caso está enterrado
a canoa do amor se quebrou no quotidiano
Estamos quites inútil o apanhado
da mútua dor mútua quota de dano
Vê como tudo agora emudeceu
Que tributo de estrelas a noite impôs ao céu
em horas como esta eu me ergo e converso
com os séculos a história do universo
5
Sei o pulso das palavras a sirene das palavras
Não as que se aplaudem do alto dos teatros
Mas as que arrancam caixões da treva
e os põem a caminhar quadrúpedes de cedro
Às vezes as relegam inauditas inéditas
Mas a palavra galopa com a cilha tensa
ressoa os séculos e os trens rastejam
para lamber as mãos calosas da poesia
Sei o pulso das palavras parecem fumaça
Pétalas caídas sob o calcanhar da dança
Mas o homem com lábios alma carcaça.

(Trad. Augusto de Campos)

Para ti - Walt Whitman

























Desconhecido, se tu que passas e me encontras
quiseres a mim te dirigir,
por que não o farás?
E por que eu não deveria contigo dialogar?

terça-feira, 25 de março de 2014

A visão de um anjo de costas - Ângelo Monteiro

























Não é por mero protesto
nossos cabelos nos ombros:
somos bem pouco terrestres,
somos mais venusianos. 

Escondem asas secretas
estes cabelos que usamos:
como todos os estetas
as coisas prefiguramos.

De modo que as imagens
das vossas alegorias
são bem pouco, comparadas
com a nossa telepatia 

e o nosso poder de usar
só as palavras supremas:
não somente as necessárias,
mas aquelas que o homem teme. 

O resto comunicamos
por meio dos nossos olhos:
em nós, poços de energia,
em vós, poças de silêncio. 

Nem contempleis nossos ombros:
cabelos vertiginosos
e tênues, como os abismos,
perturbarão vosso sono.

segunda-feira, 24 de março de 2014

Discurso sobre o Vazio - Ângelo Monteiro

Dura necessidade
de invocar os objetos,
como se dependêssemos
deles para existir. 

Como se o seu vazio
fosse menor que o nosso:
nós que usamos palavras
por medo do silêncio.

Cantigas de Fingimento VIII - Ângelo Monteiro

















Escrevo como quem nada
sabe dizer, mas dizendo
a mão sinto arrebatada
para o que eu não compreendo:

Mesmo sem saber a estrada
não me entrego nem me rendo. 

Quero dormir. Só o sono
me interessa e nada mais.
Em vão procuro abandono
para o meu corpo sem paz: 

Mas meu invisível dono
minha vontade não faz.

quinta-feira, 20 de março de 2014

Apontamento - Sérgio Leandro




















Às margens do meu sonho
o mundo vomita sobre
os homens
o dia,
o café amargo ou doce demais,
as recordações tristes que insistem,
as pequenas alegrias,
os comércios de sempre:
o preço do pão,
a gasolina,
a página impressa.
Às margens do meu sonho
dragões cospem fogo
nos capinzais da razão humana.
O dia de hoje não precisava deste apontamento.


13/02/2009

Eva - Sérgio Leandro.

























Eu amo o inferno
que trazes entre as pernas,
teu cheiro inebriante de cio,
as maçãs vermelhas,
os teus ais,
a flor em chamas do teu sexo,
tudo aquilo que guardas,
negas, mas depois me entregas...
da cor dos teus cabelos
ao sangue dos teus pés
loucura e fome se constroem,
o pecador devora o santo.
Deita-te comigo e me ama
doce e ferozmente,
que o leite da espera
anseia o cálice do teu corpo.



10/03/2009

Saída de Emergência - Sérgio Leandro




















Meu coração tem uma porta lateral
por onde entram e saem a todo instante
o homem que perdeu a direção,
o cão de olhos tristes,
a criança sem pai,
o poema que não foi passado a limpo...
o que sei da vida é muito pouco
para calar meus medos infantis
e acalentar o homem apavorado.
Meu coração tem uma porta lateral
por onde arrasto um punhado de canções
para alegrar o cão de olhos tristes,
a criança sem pai,
e o homem apavorado.



13/02/2009

Aprendiz - Magna Santos

























Ah, um dia de semente é tudo o que se quer...
Terra molhada
Sol a aquecer
Tempo a trabalhar

Deveras o tempo nos ajuda
É fato
Deveras ele nos atrapalha
Quando queremos

Há tanto a se aprender
E muito a se calar...
Como uma verdadeira semente

E assim ficarei nesta sementeira
Criada em dia de lua
E noite de vento

Sou aprendiz
Neste espaço que ainda desconheço
Mas experimento
Sem pretensão

Em meio ao plural
Me singularizo
Sacudo minhas mãos
E torno a sujá-las
Graças a Deus
Que Ele me ensine, então, mais uma vez.

Obrigada, Senhor, por tudo
E abençoe a todos que por aqui passarem.

Fabrício Carpinejar.





















Tens de acreditar que os ventos soprarão;
crer na grama nos dias de neve.
É por essa razão que os pássaros podem
cantar em seus dias mais escuros,
eles acreditam na volta da primavera!

Só na velhice a mesa fica repleta de ausências.
Chego ao fim, uma corda que aprende seu limite
após arrebentar-se em música.
Creio na cerração das manhãs.
Conforto-me em ser apenas homem.

Envelheci,
tenho muita infância pela frente.
 

Fonte: http://interludioemflor.blogspot.com/

Alberto da Cunha Melo.

























Cai um silêncio de ondas longas
e sucessivas como a chuva.
E que silêncio será esse
que cai assim antes de mim?
Fauna marinha, gestos lentos
de anjos calados golpeando
um polvo em fúria que me espera
(sob os sonhos). Há quanto tempo?
Poucos amigos, tudo salvo,
ainda temos nossas raivas
e uma esperança ilimitada
nos setembros. Mas, até quando?
Caem livros silenciosos
das prateleiras: baixa a luz
morna e abundante sobre as capas.
Que foi feito de tanta noite?
A esperança nova se agarra
entre as barreiras e as ossadas
de nossos morros. E por que

morremos antes de salvá-la?

Outonal - Sérgio Leandro























Ornamentavam a minha tarde
as folhas que tombavam das árvores
em honra do outono.

Eu teci com minhas preces vazias
um tapete para recobrir o infortúnio
de estar tão perto e tão distante do Deus vizinho...

Nem céu, nem inferno
somente o desassossego
debaixo do ruflar de asas do querer contrariado

Nem céu, nem inferno
somente folhas secas
recobrindo o chão do outono com mensagens para
os homens.


04/02/2009

quarta-feira, 19 de março de 2014

Preces ao Futuro - Luciana Cavalcanti



















Para o meu avô

Nunca nos cansemos de dizer
das coisas mais belas e boas:
fruta colhida no quintal,
entardecer olhando o céu,
prosear de compadres na calçada,
novena e procissão
no interior. Gente simples
falando com Deus!

Nunca nos cansemos de dizer
dos amores mais fundos e certos:
cabelos brancos,
riso franco, voz cansada
carregando tanta ternura
que parece até que o tempo
multiplica a força do amor em mil,
cada dia...

Nunca nos cansemos de ser
como sonhamos ser quando crianças,
sábios e grandes
porque sabedores das coisas,
conhecedores do Mundo,
amigo das gentes, desde as influentes
às mais simples. E, todas, importantes!

Nunca nos cansemos de ter,
como mirante para olhar o Mundo,
uma despretensiosa cadeira na calçada
e a disposição de conversar e aprender.

Nunca nos cansemos de trabalho e riso,
de abençoar crianças,
de rir-se das brincadeiras desta meninada.

Nunca nos cansemos de sermos a força
do Amor com que asfaltamos nossa estrada...!



















Passar pelo velho caminho
Com os cacos de azulejos portugueses
À beira da estrada

Viver sem precisar de nada!

A vida não tem explicação!

É apenas tão somente
Seguir o coração!


Carlos Maia
18/03/14

terça-feira, 18 de março de 2014

Cigarra Matinal - Erickson Luna e Nelson Torreão Jr.




















As canções são algo de calmante
nas minhas manhãs
Com chuva, com sol ou com nada
Eu me sinto bem

Quando nada
Uma frase, um acorde
Acompanha o ser só
Quando só
Eu vejo que estou triste
E começo a cantar, e cantar

O compasso é o dia que passa
Maior e menor
E a medida
É uma concha de lata, ferrugem e suor

Mas se as notas
Pretendem calar o inqueto rumor
O que fazem
É abrir um veio
Por onde sangrar minha dor

Coração de Poeta - Sérgio Leandro


















Eu caso meu coração de poeta

com o cheiro de café 
da manhã que nasce.



Eu caso meu coração de poeta
com os caminhos do esquecimento,
com as bandeiras sem pátria,
e com a cor sem nome que enche teus olhos tristes.



Com anjos do presente
e fantasmas do passado
eu caso meu coração de poeta.



Vejo homens acenando adeus.
Quando eles me saúdam sorridentes pelas ruas,
uma lágrima despenca de seus sorrisos.



Alguém plantou inquietação no coração do homens.

04/02/2009

Reinvenção - Cecília Meireles

























A vida só é possível
reinventada.

Anda o sol pelas campinas
e passeia a mão dourada
pelas águas, pelas folhas...
Ah! tudo bolhas
que vem de fundas piscinas
de ilusionismo... — mais nada.

Mas a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada.

Vem a lua, vem, retira
as algemas dos meus braços.
Projeto-me por espaços
cheios da tua Figura.
Tudo mentira! Mentira
da lua, na noite escura.

Não te encontro, não te alcanço...
Só — no tempo equilibrada,
desprendo-me do balanço
que além do tempo me leva.
Só — na treva,
fico: recebida e dada.

Porque a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada.

segunda-feira, 17 de março de 2014

Eu dedido esta música a minha netinha que também se chama Luíza!!!!!

Diretamente de Ana Blue!!!!!




"SALA DE AULA: Nenhuma experiência é inválida se não desperdiçamos a oportunidade de extrair o aprendizado que ela propõe...Esbarramos todo o tempo com estas bandejas de ofertas....Aos poucos, a cada lição valorizada, perceberemos por trás de tudo, a autoria da Evolução oferecendo-se a mando da Sabedoria de ser e agir...Quem lamenta-se das situações vividas, nada aprendeu beneficamente e consequentemente: ficou estacionado á margem amarga da estrada..."
























Procura na tua orelha 
meu desaviso abafado,
pendurado do avesso 
no extremo do teu brinco aperolado.

Preenche com sopro 
cada uma das letras desenhadas,
roubadas sob o som do teu alfabeto ancestral, 
impossíveis de serem pronunciadas.

Perpassa o sentido
da bigorna ao estribo, da timpânica à faringe
do meu texto poliglota de dez mil erros.

Desliza com gozo minhas senhas abertas
pela trompa onde Eustáquio corrige
a pressão, a altitude, os horrores.

Boceje, engula
minha mensagem pintada com teus líquidos coloridos.
meus sinais inacabados no teu ouvido, olvido.



Aleksander Aguilar

Fim da Estação - Tomas Tranströmer




Eu continuei a viagem
Para além do fim da estação.

Quantos eram? Quatro,
Cinco, poucos mais.

Casas, caminhos, nuvens,
Enseadas azuis, montanhas
Abrem as suas portas.
 Tomas Tranströmer - Prêmio Nobel de Literatura em 2.011.



"Lembrar que estarei morto em breve é a ferramenta mais importante que já encontrei para me ajudar a tomar grandes decisões. Porque quase tudo - expectativas externas, orgulho, medo de passar vergonha ou falhar - caem diante da morte, deixando apenas o que é importante. Não há razão para não seguir o seu coração. Lembrar que você vai morrer é a melhor maneira que conheço para evitar a armadilha de pensar que você tem algo a perder. Você já está nu. Não há razão para não seguir seu coração."
 
Steve Jobs

sábado, 15 de março de 2014




















A pedra
nada pergunta ao rio
sobre água e tempo.


Yeda Prates Bernis




















Não tenho cadernos.
Tudo o que escrevo
escrevo nas paredes do meu quarto.
Se é para estar presa
que seja entre quatro poemas...


Rita Apoena

sexta-feira, 14 de março de 2014




















Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.

Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento.

Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida,
que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.

(Antônio Gedeão)


Poema de Natal - Carlos Pena Filho




— Sino, claro sino,
tocas para quem?
— Para o Deus menino
que de longe vem.

— Pois se o encontrares
traze-o ao meu amor.
— E que lhe ofereces,
velho pecador?

- Minha fé cansada,
meu vinho, meu pão,
meu silêncio limpo,
minha solidão.