Macho e fêmea os criou.
Bíblia: Gênese, 1, 27
I
Hoje é sábado, amanhã é domingo
A vida vem em ondas, como o mar
Os bondes andam em cima dos trilhos
E Nosso Senhor Jesus Cristo morreu na Cruz para nos salvar.
Hoje é sábado, amanhã é domingo
Não há nada como o tempo para passar
Foi muita bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo
Mas por via das dúvidas livrai-nos meu Deus de todo mal.
Hoje é sábado, amanhã é domingo
Amanhã não gosta de ver ninguém bem
Hoje é que é o dia do presente
O dia é sábado.
Impossível fugir a essa dura realidade
Neste momento todos os bares estão repletos de homens vazios
Todos os namorados estão de mãos entrelaçadas
Todos os maridos estão funcionando regularmente
Todas as mulheres estão atentas
Porque hoje é sábado.
II
Neste momento há um casamento
Porque hoje é sábado.
Há um divórcio e um violamento
Porque hoje é sábado.
Há um homem rico que se mata
Porque hoje é sábado.
Há um incesto e uma regata
Porque hoje é sábado.
Há um espetáculo de gala
Porque hoje é sábado.
Há uma mulher que apanha e cala
Porque hoje é sábado.
Há um renovar-se de esperanças
Porque hoje é sábado.
Há uma profunda discordância
Porque hoje é sábado.
Há um sedutor que tomba morto
Porque hoje é sábado.
Há um grande espírito de porco
Porque hoje é sábado.
Há uma mulher que vira homem
Porque hoje é sábado.
Há criancinhas que não comem
Porque hoje é sábado.
Há um piquenique de políticos
Porque hoje é sábado.
Há um grande acréscimo de sífilis
Porque hoje é sábado.
Há um ariano e uma mulata
Porque hoje é sábado.
Há uma tensão inusitada
Porque hoje é sábado.
Há adolescências seminuas
Porque hoje é sábado.
Há um vampiro pelas ruas
Porque hoje é sábado.
Há um grande aumento no consumo
Porque hoje é sábado.
Há um noivo louco de ciúmes
Porque hoje é sábado.
Há um garden-party na cadeia
Porque hoje é sábado.
Há uma impassível lua cheia
Porque hoje é sábado.
Há damas de todas as classes
Porque hoje é sábado.
Umas difíceis, outras fáceis
Porque hoje é sábado.
Há um beber e um dar sem conta
Porque hoje é sábado.
Há uma infeliz que vai de tonta
Porque hoje é sábado.
Há um padre passeando à paisana
Porque hoje é sábado.
Há um frenesi de dar banana
Porque hoje é sábado.
Há a sensação angustiante
Porque hoje é sábado.
De uma mulher dentro de um homem
Porque hoje é sábado.
Há a comemoração fantástica
Porque hoje é sábado.
Da primeira cirurgia plástica
Porque hoje é sábado.
E dando os trâmites por findos
Porque hoje é sábado.
Há a perspectiva do domingo
Porque hoje é sábado.
III
Por todas essas razões deveria ter sido riscado do Livro das Origens, ó Sexto Dia da Criação.
De fato, depois da Ouverture do Fiat e da divisão de luzes e trevas
E depois, da separação das águas, e depois, da fecundação da terra
E depois, da gênese dos peixes e das aves e dos animais da terra
Melhor fora que o Senhor das Esferas tivesse descansado.
Na verdade, o homem não era necessário
Nem tu, mulher, ser vegetal, dona do abismo, que queres como as plantas, imovelmente e nunca saciada
Tu que carregas no meio de ti o vórtice supremo da paixão.
Mal procedeu o Senhor em não descansar durante os dois últimos dias
Trinta séculos lutou a humanidade pela semana inglesa
Descansasse o Senhor e simplesmente não existiríamos
Seríamos talvez pólos infinitamente pequenos de partículas cósmicas em queda invisível na terra.
Não viveríamos da degola dos animais e da asfixia dos peixes
Não seríamos paridos em dor nem suaríamos o pão nosso de cada dia
Não sofreríamos males de amor nem desejaríamos a mulher do próximo
Não teríamos escola, serviço militar, casamento civil, imposto sobre a renda e missa de sétimo dia,
Seria a indizível beleza e harmonia do plano verde das terras e das águas em núpcias
A paz e o poder maior das plantas e dos astros em colóquio
A pureza maior do instinto dos peixes, das aves e dos animais em cópula.
Ao revés, precisamos ser lógicos, freqüentemente dogmáticos
Precisamos encarar o problema das colocações morais e estéticas
Ser sociais, cultivar hábitos, rir sem vontade e até praticar amor sem vontade
Tudo isso porque o Senhor cismou em não descansar no Sexto Dia e sim no Sétimo
E para não ficar com as vastas mãos abanando
Resolveu fazer o homem à sua imagem e semelhança
Possivelmente, isto é, muito provavelmente
Porque era sábado.
"Se a gente cresce com os golpes duros da vida, também podemos crescer com os toques suaves na alma." - Cora Coralina
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segunda-feira, 31 de agosto de 2015
domingo, 30 de agosto de 2015
Hugh Selwyn Mauberly
(trecho)
Vai, livro natimudo,
E diz a ela
Que um dia me cantou essa canção de Lawes:
Houvesse em nós
Mais canção, menos temas,
Então se acabariam minhas penas,
Meus defeitos sanados em poemas
Para fazê-la eterna em minha voz
Diz a ela que espalha
E diz a ela
Que um dia me cantou essa canção de Lawes:
Houvesse em nós
Mais canção, menos temas,
Então se acabariam minhas penas,
Meus defeitos sanados em poemas
Para fazê-la eterna em minha voz
Diz a ela que espalha
Tais tesouros no ar,
Sem querer nada mais além de dar
Vida ao momento,
Que eu lhes ordenaria: vivam,
Quais rosas, no âmbar mágico, a compor,
Rubribordadas de ouro, só
Uma substância e cor
Desafiando o tempo.
Sem querer nada mais além de dar
Vida ao momento,
Que eu lhes ordenaria: vivam,
Quais rosas, no âmbar mágico, a compor,
Rubribordadas de ouro, só
Uma substância e cor
Desafiando o tempo.
Diz a ela que vai
Com a canção nos lábios
Mas não canta a canção e ignora
Com a canção nos lábios
Mas não canta a canção e ignora
Quem a fez, que talvez uma outra boca
Tão bela quanto a dela
Em novas eras há de ter aos pés
Os que a adoram agora,
Quando os nossos dois pós
Com o de Waller se deponham, mudos,
No olvido que refina a todos nós,
Até que a mutação apague tudo
Salvo a Beleza, a sós.
Tão bela quanto a dela
Em novas eras há de ter aos pés
Os que a adoram agora,
Quando os nossos dois pós
Com o de Waller se deponham, mudos,
No olvido que refina a todos nós,
Até que a mutação apague tudo
Salvo a Beleza, a sós.
Ezra Pound
Fonte: http://blogdoitarcio2.blogspot.com.br/
sexta-feira, 28 de agosto de 2015
CALMARIA
livre
é tudo que eu sei
sangrando tão nu
como um chocalho
que enche de mar
as redes por onde nadei
livre
é tudo que espera
como um anzol que sorri
ao ver sua presa
escapolir
livre
é tudo que se vê
como uma garoa
que vai e que tem
o sorriso de uma menina
livre
é tudo que sirva
como uma fumaça
de costas por cima
livre
é tudo que passa
entre a chuva
e a borrasca.
Cgurgel
livre
é tudo que eu sei
sangrando tão nu
como um chocalho
que enche de mar
as redes por onde nadei
livre
é tudo que espera
como um anzol que sorri
ao ver sua presa
escapolir
livre
é tudo que se vê
como uma garoa
que vai e que tem
o sorriso de uma menina
livre
é tudo que sirva
como uma fumaça
de costas por cima
livre
é tudo que passa
entre a chuva
e a borrasca.
Cgurgel
FLORESTA
desapareça
mingue o horóscopo
por onde seus olhos passeiam
mingue o horóscopo
por onde seus olhos passeiam
diga
para sua sombra
que as horas
são como tochas acesas
para sua sombra
que as horas
são como tochas acesas
saiba
pois o vento não volta
que as portas que você abriu
não saberão reconhecer suas chaves
pois o vento não volta
que as portas que você abriu
não saberão reconhecer suas chaves
a cisterna
plena de chatos
recua
plena de chatos
recua
sustente
seus dedos toscos
impregnados
de valsas vadias
seus dedos toscos
impregnados
de valsas vadias
sobre seu chão
erga sua pá de mdf
e liberte entre portas
o azinhavre de um oi
erga sua pá de mdf
e liberte entre portas
o azinhavre de um oi
e ao se for
olhe para trás
olhe para trás
pois a loucura
maldita e profana
te faz companhia.
maldita e profana
te faz companhia.
Cgurgel
quarta-feira, 26 de agosto de 2015
A uma passante
A rua em torno era um frenético alarido.
Toda de luto, alta e sutil, dor majestosa,
Uma mulher passou, com sua mão suntuosa
Erguendo e sacudindo a barra do vestido.
Toda de luto, alta e sutil, dor majestosa,
Uma mulher passou, com sua mão suntuosa
Erguendo e sacudindo a barra do vestido.
Pernas de estátua, era-lhe a imagem nobre e fina.
Qual bizarro basbaque, afoito eu lhe bebia
No olhar, céu lívido onde aflora a ventania,
A doçura que envolve e o prazer que assassina.
Qual bizarro basbaque, afoito eu lhe bebia
No olhar, céu lívido onde aflora a ventania,
A doçura que envolve e o prazer que assassina.
Que luz… e a noite após! – Efêmera beldade
Cujos olhos me fazem nascer outra vez,
Não mais hei de te ver senão na eternidade?
Cujos olhos me fazem nascer outra vez,
Não mais hei de te ver senão na eternidade?
Longe daqui! tarde demais! “nunca” talvez!
Pois de ti já me fui, de mim tu já fugiste,
Tu que eu teria amado, ó tu que bem o viste!
Pois de ti já me fui, de mim tu já fugiste,
Tu que eu teria amado, ó tu que bem o viste!
Charles Baudelaire
"As Flores do Mal" (Edição Bilíngue)
"As Flores do Mal" (Edição Bilíngue)
Tradução: Ivan Junqueira
Fonte: Magia da Poesia
terça-feira, 25 de agosto de 2015
CLARINHO
Joguei todos os meus sonhos
medonhos
no mar
e agora espero novas ondas
com seios morenos
espuma do mar
saia branca das sereias
cansadas de amor
Areia,
palco de luz
espelho do céu
vem dormir comigo
neste quarto sem portas
Trincos de caracol
para enfeitar a lua
Hoje à noite
irei dormir no mar
Vou despertar os deuses
do amor
que foram náufragos
em meus sonhos medonhos
vou dormir no mar
Hoje vou ser
claramente
um negro.
Miró da Muribeca
"Quem descobriu o azul anil?"
segunda-feira, 24 de agosto de 2015
domingo, 23 de agosto de 2015
Eros e Pisquê - Fernando Pessoa
E assim vêdes, meu Irmão, que as verdades
que vos foram dadas no Grau de Neófito, e
aquelas que vos foram dadas no Grau de Adepto
aquelas que vos foram dadas no Grau de Adepto
Menor, são, ainda que opostas, a mesma verdade.
(Do Ritual Do Grau De Mestre Do Átrio
(Do Ritual Do Grau De Mestre Do Átrio
Na Ordem Templária De Portugal)
Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,
E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.
Fonte: http://blogdoitarcio2.blogspot.com.br/
quarta-feira, 19 de agosto de 2015
terça-feira, 18 de agosto de 2015
segunda-feira, 17 de agosto de 2015
17 E, no primeiro dia da festa dos pães ázimos, chegaram os discípulos junto de Jesus, dizendo: Onde queres que façamos os preparativos para comeres a páscoa?
18 E ele disse: Ide à cidade, a um certo homem, e dizei-lhe: O Mestre diz: O meu tempo está próximo; em tua casa celebrarei a páscoa com os meus discípulos.
19 E os discípulos fizeram como Jesus lhes ordenara, e prepararam a páscoa.
20 E, chegada a tarde, assentou-se à mesa com os doze.
21 E, comendo eles, disse: Em verdade vos digo que um de vós me há de trair.
22 E eles, entristecendo-se muito, começaram cada um a dizer-lhe: Porventura sou eu, Senhor?
23 E ele, respondendo, disse: O que põe comigo a mão no prato, esse me há de trair.
24 Em verdade o Filho do homem vai, como acerca dele está escrito, mas ai daquele homem por quem o Filho do homem é traído! Bom seria para esse homem se não houvera nascido.
25 E, respondendo Judas, o que o traía, disse: Porventura sou eu, Rabi? Ele disse: Tu o disseste.
26 E, quando comiam, Jesus tomou o pão, e abençoando-o, o partiu, e o deu aos discípulos, e disse: Tomai, comei, isto é o meu corpo.
27 E, tomando o cálice, e dando graças, deu-lho, dizendo: Bebei dele todos;
28 Porque isto é o meu sangue, o sangue do novo testamento, que é derramado por muitos, para remissão dos pecados.
29 E digo-vos que, desde agora, não beberei deste fruto da vide, até aquele dia em que o beba novo convosco no reino de meu Pai.
(Mateus 25:17-29)
Arte: Salvador Dalí
domingo, 16 de agosto de 2015
A janela do quarto,
na semiobscuridade,
bate repetidamente.
É o vento
trazendo lembranças
e fantasmas
das lonjuras do tempo.
Vento forte
quebrando a solidão
do bronze das estátuas,
esquecidas
nas praças desertas.
A cidade dorme
com suas feridas expostas.
Pedro Luso de Carvalho
trazendo lembranças
e fantasmas
das lonjuras do tempo.
Vento forte
quebrando a solidão
do bronze das estátuas,
esquecidas
nas praças desertas.
A cidade dorme
com suas feridas expostas.
Pedro Luso de Carvalho
Fonte: http://blogdoitarcio2.blogspot.com.br/
1 Os que confiam no SENHOR serão como o monte de Sião, que não se abala, mas permanece para sempre.
2 Assim como estão os montes à roda de Jerusalém, assim o Senhor está em volta do seu povo desde agora e para sempre.
3 Porque o cetro da impiedade não permanecerá sobre a sorte dos justos, para que o justo não estenda as suas mãos para a iniquidade.
4 Faze bem, ó Senhor, aos bons e aos que são retos de coração.
5 Quanto àqueles que se desviam para os seus caminhos tortuosos, levá-los-á o SENHOR com os que praticam a maldade; paz haverá sobre Israel.
(Salmo 125)
Eu creio que muitas vezes,
na maioria das vezes, as palavras não traduzem bem o que nós estamos pensando.
Principalmente a palavra escrita. A entonação, a pausa, são fatores às vezes
mais importantes do que o próprio signo ali, escrito num papel ou na web. Um
olhar então, ah, um olhar então nem se fala! Quantas vezes eu me perdi
navegando num olhar! Linguagem de alma para alma! Intraduzível em palavras!
Por isso
que o trabalho do poeta é muitas vezes tão árduo! É um garimpar de signos!
Junto a outros signos! Mas quando achamos a pepita... Ah, quando achamos a
pepita, o grande diamante azul, brincadeira... Tem poemas que valem toda uma
vida!
Carlos Maia
sábado, 15 de agosto de 2015
sexta-feira, 14 de agosto de 2015
Que a serpente fique à espreita
por entre a relva. Que a escritura
seja feita de palavras,
lentas e rápidas, afiadas
quando golpeiam, calmas quando esperam,
e que nunca adormeçam.
Reconciliar, pela metáfora,
as pessoas e as pedras.
Construir. (Não com idéias
mas com coisas) Inventar!
Minha flor é a saxífraga:
a que faz estalar a rocha.
William Carlos Williams, “A sort of a song”
TESTAMENTO DE UM POETA
Abrigue para mim meu bem maior
É chegada minha despedida
Concederam meu desabrochar desta vida
É chegada minha despedida
Concederam meu desabrochar desta vida
Guarde para mim todas as terras por onde pisei
Os mares onde naveguei
O céu e a lua quando nem lembrávamos das duas
As estrelas que achei em teus olhos
A saudade desfalecida e satisfeita na areia
Minha luz que por vezes lhe faltava
Ah, amava ser clarão com que lhe irradiava
Os mares onde naveguei
O céu e a lua quando nem lembrávamos das duas
As estrelas que achei em teus olhos
A saudade desfalecida e satisfeita na areia
Minha luz que por vezes lhe faltava
Ah, amava ser clarão com que lhe irradiava
Nosso voo cerceado e ignorado pela vivacidade da paixão
Animosidade e inconformismo com o tempo
Alegria e tristeza
Pura proeza
Animosidade e inconformismo com o tempo
Alegria e tristeza
Pura proeza
Guarde para mim
Desprovida de qualquer bem material
Deixei tudo registrado em dias
Em anos, madrugadas e manhãs
Para que não me esquecesse que existia
Afã em me fazer existir
Somente assim sei que vivi
Desprovida de qualquer bem material
Deixei tudo registrado em dias
Em anos, madrugadas e manhãs
Para que não me esquecesse que existia
Afã em me fazer existir
Somente assim sei que vivi
Guarde com carinho e zelo
Minha Poesia registrada em rascunhos de vida
Meus anseios almejando saída
Entroncamentos onde me vi dividida
Minha Poesia registrada em rascunhos de vida
Meus anseios almejando saída
Entroncamentos onde me vi dividida
Tudo o que pude ser de melhor ficaram nas escritas
Não chore por dor ou lamente-se por não poder se opor
Nas escritas tem meu consolo
Minha força interior
Esperança de criança
Minhas lágrimas de quem soube nem ser tanta
Não chore por dor ou lamente-se por não poder se opor
Nas escritas tem meu consolo
Minha força interior
Esperança de criança
Minhas lágrimas de quem soube nem ser tanta
Faça uso delas
Leve as contigo e faça o que não consegui e sempre quis
Tudo o que vivi
Tudo o que morri
Tudo o que sonhei
Leve as contigo e faça o que não consegui e sempre quis
Tudo o que vivi
Tudo o que morri
Tudo o que sonhei
Mesmo que eu vire pó
Lhe causando tristeza
Deixando te só
Deixo tudo em testamento
Tudo o que tenho me foi emprestado
Eternizados em folha de papel
Reluzente como ouro
Meu maior tesouro...
Minha Poesia!
Lhe causando tristeza
Deixando te só
Deixo tudo em testamento
Tudo o que tenho me foi emprestado
Eternizados em folha de papel
Reluzente como ouro
Meu maior tesouro...
Minha Poesia!
LUCILA ISIPON
da minha janela vê-se uma espécie muito rara de angústia
tem o corpo que não ousei que me fosse
usa o amor como se fosse a origem da sede
e sossega-se contra o peito da alvorada
tem o corpo que não ousei que me fosse
usa o amor como se fosse a origem da sede
e sossega-se contra o peito da alvorada
da minha janela vê-se uma espécie única de medo
chama-se eu mas diz-se tu
e por vezes nós quando prende a vida
a algo tão falível como a vida
chama-se eu mas diz-se tu
e por vezes nós quando prende a vida
a algo tão falível como a vida
da minha janela não se vê mais nada
ouve-se o silêncio contra mim
e chove morte contra os vidros
por dentro como soa o fim
ouve-se o silêncio contra mim
e chove morte contra os vidros
por dentro como soa o fim
Pedro Sena-Lino
quarta-feira, 12 de agosto de 2015
Flores do mais
devagar escreva
uma primeira letra
escreva
nas imediações construídas
pelos furacões;
devagar meça
a primeira pássara
bisonha que
riscar
o pano de boca
aberto
sobre os vendavais;
devagar imponha
o pulso
que melhor
souber sangrar
sobre a faca
das marés;
devagar imprima
o primeiro
olhar
sobre o galope molhado
dos animais; devagar
peça mais
e mais e
mais
uma primeira letra
escreva
nas imediações construídas
pelos furacões;
devagar meça
a primeira pássara
bisonha que
riscar
o pano de boca
aberto
sobre os vendavais;
devagar imponha
o pulso
que melhor
souber sangrar
sobre a faca
das marés;
devagar imprima
o primeiro
olhar
sobre o galope molhado
dos animais; devagar
peça mais
e mais e
mais
Ana Cristina César
segunda-feira, 10 de agosto de 2015
Passará
Tem passado
Passa com a sua fina faca.
Tem passado
Passa com a sua fina faca.
Tem nome de ninguém.
Não faz ruído. Não fala.
Mas passa com a sua fina faca.
Não faz ruído. Não fala.
Mas passa com a sua fina faca.
Fecha feridas, é unguento.
Mas pode abrir a tua mágoa
Com a sua fina faca.
Mas pode abrir a tua mágoa
Com a sua fina faca.
Estanca ventura e voz
Silêncio e desventura.
Imóvel
Garrote
Algoz
No corpo da tua água passará
Tem passado
Passa com a sua fina faca.
Silêncio e desventura.
Imóvel
Garrote
Algoz
No corpo da tua água passará
Tem passado
Passa com a sua fina faca.
Hilda Hilst
domingo, 9 de agosto de 2015
SEMPRE DE NOVO
Sempre de novo, mesmo conhecendo a paisagem do amor
e o pequeno cemitério com os seus nomes comoventes,
e o abismo, terrivelmente mudo, onde os outros
terminaram: sempre de novo saímos, a dois,
sob as velhas árvores; deitamo-nos, sempre de novo,
entre as flores e de frente para o céu.
e o pequeno cemitério com os seus nomes comoventes,
e o abismo, terrivelmente mudo, onde os outros
terminaram: sempre de novo saímos, a dois,
sob as velhas árvores; deitamo-nos, sempre de novo,
entre as flores e de frente para o céu.
Rainer Maria Rilke
In Senhor, é Tempo
In Senhor, é Tempo
sábado, 8 de agosto de 2015
PERISCÓPIO
aqui estou
filho do tempo e do mar
filho do tempo e do mar
como um infante
que tece de silêncios
seus dias e faróis
que tece de silêncios
seus dias e faróis
sou sua noite
vestida de arrecifes
e trampolins
vestida de arrecifes
e trampolins
pega meus braços
nos penhascos
onde choras
e te escondes
nos penhascos
onde choras
e te escondes
pisa o solo
ao redor dos pássaros
e dos seus medos
ao redor dos pássaros
e dos seus medos
canta
como uma criança
que corre e não se espanta
como uma criança
que corre e não se espanta
protege a noite
como um caminhante
do seu paraíso e clarim
como um caminhante
do seu paraíso e clarim
e
quando despertar
acalenta tudo que move
entre seu corpo
e o mundo que dorme.
quando despertar
acalenta tudo que move
entre seu corpo
e o mundo que dorme.
Cgurgel
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