No post de hoje decidi começar uma coluna e
publicar uma série de conselhos de alguns grandes escritores para novos
autores. Hoje, começaremos com o americano Chuck Palahniuk,
autor de Clube da Luta e um nome influente na literatura
nas últimas décadas. Aqui, nesta análise, ele dá algumas dicas de como
distinguir “boa literatura” de um “lixo melodramático qualquer”, coisas
simples, sem questões complexas inventadas pela crítica, mas pequenos detalhes
que constituem a essência do que é escrever, do ofício do Escritor. Não vou
tomar muito da sua leitura, então, seguem as palavras de Palahniuk:
Itárcio Ferreira
Em seis segundos,
você vai me odiar. Mas em seis meses, será um escritor melhor.
De agora em diante –
pelo menos pelo próximo meio ano – você não poderá usar “verbos de pensamento”,
incluindo: pensar, saber, entender, perceber, acreditar, querer, lembrar,
imaginar, desejar e centenas de outros que você ama.
Essa lista também
deve incluir: amar e odiar. E pode se estender a ser e ter, mas nós vamos
chegar nesse mais tarde.
Até mais ou menos o
natal, você não poderá escrever: “Kenny se perguntou se Mônica não gostava que
ele saísse à noite…”
Em vez disso,
você terá de desmembrar isso em algo como: “Nas manhãs que se seguiam às
noites em que Kenny estava fora depois do último ônibus, quando ele teria
que pegar uma carona ou pagar por um carro para chegar em casa e encontrar
Mônica fingindo dormir – porque ela nunca dormia daquela forma tão tranquila –
naquelas manhãs, ela sempre colocava apenas sua xícara de café no microondas.
Nunca a dele.
Em vez de fazer seus
personagens saberem qualquer coisa, você deve agora apresentar detalhes que
permitam que o leitor os conheça. Em vez de fazer seus personagens quererem
alguma coisa, você deve agora descrever a coisa para que seus leitores passem a
querê-la também.
Em vez de dizer:
“Adam sabia que Gwen gostava dele.”, você terá que dizer: “No intervalo entre
as aulas, Gwen se encostava no armário de Adam quando ele se aproximava
para abri-lo. Ela rolava os olhos e partia, deixando uma marca negra
no metal, mas também seu perfume. O cadeado ainda estava quente pelo contato
com suas nádegas. E, no próximo intervalo, Gwen estaria encostada ali, outra
vez.”
Para resumir, pare
de utilizar atalhos. Apenas detalhes sensoriais específicos: ações, cheiros,
gostos, sons e sensações.
Normalmente, os
escritores usam esses “verbos de pensamento” no início dos parágrafos (dessa
forma, você pode chamá-los de “afirmação de tese”, e eu vou protestar
contra eles mais tarde). De certo modo, eles afirmam a intenção daquele
parágrafo. E, o que se segue, ilustra essa intenção.
Por exemplo: “Brenda
sabia que ela nunca cumpriria o prazo. O trânsito estava terrível desde a ponte,
passadas as primeiras oito ou nove saídas. A bateria do celular havia se
esgotado. Em casa, os cachorros precisariam sair para um passeio, caso
contrário haveria uma grande bagunça para limpar depois. Além disso, ela
prometeu que aguaria as plantas para o vizinho…”
Você percebe como
essa “afirmação de tese” tira o brilho do que se segue? Não faça isso.
Se não tiver jeito,
corte a sentença de abertura e coloque-a depois de todas as outras. Melhor
ainda, mude para: “Brenda nunca cumpriria o prazo.”
Pensar é abstrato.
Saber e acreditar são intangíveis. Sua história sempre vai ser mais forte se
você mostrar apenas as ações físicas e os detalhes dos seus personagens e
permitir que seu leitor pense e saiba. E ame e odeie.
Não diga ao leitor:
“Lisa odiava Tom.”
Em vez disso,
construa seu caso como um advogado na corte, detalhe por detalhe.
Apresente cada
evidência. Por exemplo: “Durante a chamada, no instante logo após a professora
dizer o nome de Tom, naquele momento antes que ele respondesse, bem naquele
instante, Lisa sussurrava “seu merda” justo quando Tom respondia “Presente”.
Um dos erros mais
comuns de escritores iniciantes é deixar seus personagens desacompanhados. Ao
escrever, você pode estar sozinhos. Ao ler, sua audiência vai estar
sozinha. Mas seus personagens devem passar muito pouco tempo sozinhos. Porque
um personagem desacompanhado começa a pensar, a se preocupar ou a se perguntar.
Por exemplo:
“Enquanto esperava pelo ônibus, Mark começou a se perguntar quanto tempo a
viagem tomaria…”.
Uma construção
melhor seira: “A programação dizia que o ônibus chegaria ao meio dia, mas o
relógio de Mark dizia que já eram 11:57. Dali dava para ver até o fim da rua,
até o shopping, e ele não via nenhum ônibus vindo. Sem dúvidas, o motorista
estava parado em algum retorno no fim da linha, tirando uma soneca. O motorista
estava dormindo e Mark estava atrasado. Ou pior, o motorista estava bebendo e,
quando ele parasse ali, bêbado, cobraria setenta e cinco centavos por uma
morte horrível em um acidente de trânsito.”
Um personagem
sozinho deve mergulhar em fantasia em memória, mas mesmo nesses casos você não
pode usar “verbos de pensamento” ou qualquer um de seus parentes abstratos.
Ah, e você não pode
se esquecer dos verbos lembrar e esquecer. Nada de frases como “Wanda lembrou-se
de como Nelson costumava escovar seu cabelo”.
Em vez disso, diga:
“Quando estavam no segundo ano da faculdade, Nelson costumava
arrumar o cabelo dela com escovadas suaves e longas”.
Outra vez:
desmembre. Não utilize atalhos.
Melhor ainda, coloque
o seu personagem junto com outro personagem rapidamente. Coloque-os juntos e
deixe a ação começar. Deixe a ação e as palavras mostrarem seus pensamentos.
Saia da cabeça deles.
E, enquanto estiver
evitando os “verbos de pensamento”, seja muito cauteloso ao utilizar os verbos
ser e estar.
Por exemplo:
“Os olhos de Ann
eram azuis” ou “Ana tinha olhos azuis”
versus
“Ann tossiu e
sacudiu uma mão em frente seu rosto, espantando a fumaça de cigarro de seus
olhos, olhos azuis, antes de sorrir…”
Em vez de usar os
sem graça “ser” e “ter”, tente enterrar esses detalhes dos personagens em suas
ações ou gestos. Para simplificar, isso é mostrar sua história, em vez de
contar.
E daqui para frente,
depois que você aprender a desmembrar seus personagens, você vai odiar os
escritores preguiçosos que se contentam com: “Jim sentou-se ao lado de seu
telefone, perguntando-se se Amanda não ligaria.”
Por favor. Por
enquanto, me odeie com todas as suas forças, mas não use “verbos de
pensamento”. Depois do natal, sinta-se livre, mas eu apostaria dinheiro
que você não vai voltar atrás.
(…)
Como tarefa do mês,
vasculhe suas escritas e circule cada “verbo de pensamento” que você encontrar.
Depois, encontre uma forma de eliminá-los. Mate-os através do desmembramento.
Em seguida, vasculhe
algum livro de ficção e faça o mesmo. Seja impiedoso.
“Marty imaginou um
peixe saltando sob a luz da lua…”
“Nancy lembrou-se do
sabor do vinho…”
“Larry sabia que ele
era um homem morto…”
Encontre-os. Depois,
descubra um jeito de reescrevê-los. Torne-os mais fortes.
Chuck Palahniuk
Fonte: http://blogdoitarcio2.blogspot.com.br/
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