Eu queria ser um anjo de Piero della
Francesca
Beatriz esfaqueada num beco escuro
Dante tocando piano ao crepúsculo
eu penso na vida sou reclamado pela
contemplação
olho desconsolado o contorno das coisas
copulando no caos
Eu reclamo uma lenda instantânea para o
meu Mar Morto
Tempo e Espaço pousam no meu antebraço
como um ídolo
há um osso carregando uma dentadura
Eu vejo Lautréamont num sonho nas
escadas de Santa Cecília
ele me espera no largo do Arouche no
ombro de um santuário
hoje pela manhã as árvores estavam em
Coma
meu amor cuspia brasas nas bundas dos
loucos
havia tinteiros medalhas esqueletos
vidrados flocos dálias
explodindo no cu ensanguentado dos órfãos
meninos visionários arcanjos de
subúrbio entranhas em êxtase alfinetados
nos mictórios atômicos
minha loucura atinge a extensão de uma
alameda
as árvores lançam panfletos contra o
céu cinza
Roberto Piva
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